Após ser chamada de ‘oportunista’ por Roque Ferreira, Zélia Duncan rebate sambista baiano
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Em sua coluna publicada na manhã desta sexta-feira (27), no jornal O Globo, a cantora Zélia Duncan escreveu uma resposta ao sambista baiano Roque Ferreira, que se recusou a concorrer com ela o Prêmio da Música Brasileira, na categoria de Melhor Álbum de Sambas. “Ela não é sambista, é oportunista. Entrou no samba pela porta dos fundos”, disse ele para declinar a indicação. “Se você que me lê pode estar boquiaberto, imagina onde foi parar meu grande queixo quadrado! São tempos sombrios. Isso ativou uma dorzinha, confesso, mas também muitos pensamentos e constatações. Nem todos vou descrever, mesmo porque, eu sinceramente, amo o que esse sujeito faz, em termos de música e poesia. Eu posso, claro, entender que tenha odiado o disco, que, aposto, nem ouviu”, escreveu Zélia, que se considera uma “oportunista, sem oportunismo”. “Quando fui cantar com os Mutantes, teve gente torcendo o nariz, porque eu não era roqueira. Faço teatro e não sou atriz. Escrevo pro jornal e não sou jornalista. Corro maratonas e não sou atleta. Moro no Rio, mas nasci em Niterói e fui criada em Brasília. Gosto de vinagrete, mas tenho horror a cebola crua. Tenho sotaque de carioca, mas canto São Paulo. Canto um samba sensacional de Itamar Assumpção chamado ‘Leonor’, que o libertário poeta Hermínio Bello achou ser do Ataulfo”, escreveu a artista, acrescentando: “Respira! Sou mulher, mas tenho voz de homem. Fiz um samba com Lulu Santos (calma!). Fiz uma balada com Mart’nália. Disse pro Paulinho da Viola, que é o samba em pessoa: te amo! Fiz um álbum chamado “Eu me transformo em outras”, sem te pedir licença”. Mesmo com as críticas, a cantora reiterou sua admiração ao baiano, como artista. “ (Foi mal…) Sou um paradoxo com duas pernas, tanto que ainda te amo! Mas me desculpe, estamos juntos, pois você sempre é Roque e eu sempre fui Samba!”.
Ela lembrou ainda das oportunidades em que teve contato com Roque. “Tenho muita admiração por Roque Ferreira e nesse aspecto, sempre fui Roqueira. Fui no show dele no Centro Cultural Carioca há anos, convidada por Bia Paes Leme, falei com ele ao final, emocionada. Comprei o disco, sei de cor. Levei pro meu trabalho com a cantora Simone um de seus sambas, que gravamos sem nenhuma oposição do autor, foi lindo. Depois ele me enviou um cassete, para virarmos parceiros, talvez ele não lembre, nos falamos ao telefone, com muito carinho recíproco”, disse Zélia, que rechaça as rotulações. “Me entristece o que está acontecendo, porque rótulos são coisas de gente que pensa pequeno, que não olha o céu amplamente. Pra mim, ele nunca vai ser regional, sempre vai ser um compositor brasileiro. Me chamar de roqueira muito me orgulha, mas não me traduz por completo e soa como um triste fundamentalismo musical. Eu conheço bem o trabalho de Roque Ferreira, mas ele não me conhece. Roque, muito prazer! Sou filha de baiano, sempre cantei e amei o samba. Participei de diversos trabalhos de samba”, diz a cantora, antes de enumerar nomes como Martinho, Beth, Alcione, Fundo de Quintal, Mariene de Castro e Paulinho da Viola. “É agressivo me chamar de ‘oportunista’, porque gravei sambas e antes de mais nada, me desculpe mestre, uma afirmação de quem ignora o que diz e mostra um ressentimento que não condiz com a poesia de sua obra… Pra mim, sua fã confessa, uma decepção imensa. Mas, há 35 anos cantando, já aprendi que a beleza de uma obra nem sempre vem aliada à beleza de quem a produz, por incrível que pareça… e a vida é dura para todos nós, não é? O mais irônico de tudo é que não me chamo Roque, me chamo Zélia, Roqueiro é quem me diz. E eu sou feliz!”, conclui.
BN